30 julho 2015

ANA MAE INFORMA: A CRISE EUROPEIA E A ARTE/EDUCAÇÃO

Gostei muito de uma entrevista do poeta Francisco Bosco, novo Diretor da Funarte. Quando lhe perguntaram o que se pode fazer pela Cultura sem dinheiro ele respondeu:  "Questões relativas a arte e educação, como o ensino das artes nas escolas ou os processos formativos, não custam dinheiro. Custam vontade e determinação política".

Com quase 60 anos  de trabalho como arte/educadora em todos os níveis educacionais, da educação infantil aos pós-doutorados sou mais realista. Precisamos sim, de dinheiro para Arte/Educação mas de muito pouco  em relação a outras áreas da Arte e da Cultura.


Estive na Espanha agora em julho (2015) e testemunhei uma reação muito interessante de pais de crianças contra a ausência de Arte nas escolas provocada pela crise. Eles são de uma geração que teve arte incluída em sua educação e a querem para seus filhos. Observei um workshop de uma arte/educadora excepcional cujo trabalho acompanho desde que ela era aluna de doutorado da Complutense em Madri. Seu nome é Rita Noguera.

A escola em que trabalhava fechou. Ela se apoia em seu trabalho na Pedagogia Sistêmica e na Abordagem Triangular. Atualmente desempregada como muitos amigos meus em Madri, é frequentemente convidada por mães que reúnem crianças em sua casa para fazerem Arte, já que não tem Arte na escola. Esta moda começou em aniversários. Em vez de comemorar os aniversários de seus filhos em estereotipados e caros bufês infantis, os pais conscientes da necessidade da Arte começaram a convidar arte/educadores para planejar e executar atividades artísticas para as crianças. Agora nem precisa ser aniversário.

Fotografia: Ana Lia Barbosa Lemos/Rita Noguera 

Acompanhei Rita em um workshop encomendado por uma jovem bailarina cubana, mãe de uma criança de quatro anos  em Valdemoro, cidade  perto de Madri. Ela reuniu em sua casa 11 crianças de 2 a 7 anos e seus pais (um dos bons princípios da Pedagogia Sistêmica é incluir os pais nas atividades das crianças), fez um a mesa de lanche com muita fruta e bolos mas o pagamento da professora foi dividido entre as famílias participantes. O dia estava escaldante e brilhante, o condomínio era de belas casa mas não luxuosas, chegamos uma hora antes.

Fotografia: Ana Lia Barbosa Lemos/Rita Noguera

O espaço foi cuidadosamente preparado em três setores. No primeiro setor, a sala, Rita reuniu todos sentados no chão, pais, mães sem sapatos e crianças também sem camisa, leu uma história de travessura de crianças pintando o corpo com tinta e mostrou várias imagens de pintura corporal, de diferentes civilizações, bem apresentadas em papel rígido. Rita tem o talento de prender a atenção das crianças. A conversa se desenrolou com  perguntas e comentários feitos só pelas crianças. Os pais pareciam tímidos.

Ainda na sala, Rita propôs que com lápis de cera bem macio as crianças começassem a desenhar em seus corpos. Os pais começaram a participar. Passamos para o segundo setor, um alpendre com vista para o gramado e as tintas e pincéis foram distribuídas. De início cada um com uma cor diferente depois começaram a trocar entre eles as cores e a pintarem também os pais e as mães que mergulharam na ação.

Fotografia: Ana Lia Barbosa Lemos/Rita Noguera

Fotografia: Ana Lia Barbosa Lemos/Rita Noguera

A experimentação durou uma hora e meia, até que, esgotadas as tintas que haviam sido preparadas com sabonete líquido para evitar adesão à pele, passamos para o último espaço, o gramado preparado com baldes e mangueiras.

Fotografia: Ana Lia Barbosa Lemos/Rita Noguera

Depois de limpos e enxutos devoraram os doces e as frutas. Os comentários finais foram muito entusiasmados e alimentados pelas constantes afirmações de:

- Quero mais.

Costuma-se dizer que em tempos de crise só os restaurantes permanecem ativos pois todos precisamos comer. O que vi na Espanha neste verão de 2015 é que pais conscientes das funções da Arte na Educação mesmo em tempo de crise, quando a Arte,  a proteína  da Educação, é a primeira coisa a ser cortada das escolas, providenciam experiências de atividades artísticas para seus filhos.

Mandei este texto para Rita antes de publica-lo e ela me sugeriu lembrar que neste momento de crise psicólogos inteligentes recomendam esta prática de esporádicos workshops artísticos para crianças, como é o caso de Yassodára S. Machado e Júlia Durruty, psicóloga da primeira infância que é amiga de Rita.

Ana Mae Barbosa
especial para AEP Online


Saiba mais sobre o trabalho de Rita aqui.

2 comentários:

Unknown disse...

Que relato inspirador...

Escola Stª Terezinha do Chame-Chame disse...

S-E-N-S-A-C-I-O-N-A-L !!!!