Ao
ser convidada para o Seminário da InSEA, Building
Social Cohesion through Arts Education na Namíbia, avisei que estaria na África,
no começo de novembro, ao professor Lourenço Cossa de Moçambique de quem
examinei uma excelente tese de Doutorado orientada por Analice Dutra Pilar na
UFRGS. Ele imediatamente me convidou para dar uma palestra na Universidade
Pedagógica na Escola Superior Técnica, Departamento de Desenho e Construção no
qual ele é o único professor Doutor, responsabilidade enorme para meu colega
moçambicano. Sei disto por experiência própria pois por quase dez anos fui a
única doutora em Arte/Educação no Brasil. Depois disto nos desenvolvemos muito
rapidamente graças a criação de linhas de pesquisas nas Pós-Graduações em
Artes e Educação.
Os
moçambicanos foram excelentes hospedeiros. Reuniram mais de duzentos
professores para ouvir minha palestra que eles intitularam de Ensino da
Educação Visual/Artes e formação de professores. Lá em Moçambique o nome da
Disciplina de Artes no currículo do ensino Fundamental e Médio é Educação
Visual. Os burocratas da educação estão querendo retira-la do Ensino Médio como
o governo Temer fez no Brasil. Com eu já havia notado no Seminário da InSEA na
Namíbia os homens, também em Moçambique são a maioria dos professores de Arte,
diferentemente do Brasil onde esta área é maciçamente feminina.
A
mesa de abertura de minha palestra foi composta de pessoas importantes na
Universidade e também convidaram Sílvia Bragança, arte/educadora, professora de
História da Arte e curadora. Trabalhamos juntas muitos anos no Conselho Mundial
da InSEA no qual ela representava a África e eu a América Latina (1984 a 1994).
Silvia é viúva de Aquino de Bragança um dos heróis libertadores de Moçambique
que morreu no atentado ao Presidente Samora Machel. Aquino de Bragança era jornalista
e intelectual, criador e diretor do Centro de Estudos Africanos da Universidade
Eduardo Mondlane. Visitei com Silvia esta Universidade
onde ela iniciou em Moçambique a área de Educação Visual. Silvia é extremamente
respeitada e querida por toda a intelectualidade do país que adotou, pois
nasceu em Goa na Índia, em 1937.
No dia da palestra, 6 de novembro, fui
entrevistada por TV e Rádio. O
auditório produziu um excelente e quase interminável diálogo depois de minha
palestra. As perguntas que se seguiram eram oportunas e inteligentes, demostrando
conhecimento de meus livros, especialmente da Abordagem Triangular. São alunos, professores e artistas atualizados
nas pesquisas sobre Ensino da Arte, o que lhes falta é a ampliação das
estruturas institucionais e criação
de mestrados e doutorados.
No dia seguinte tive um encontro com o grupo com o
qual Lourenço trabalha. Estão se titulando fora do país. Mestre Rangel Manjate é um teórico complexo, designer gráfico e professor em Educação Visual,
Marcos Muthewuye um escultor muito
talentoso e José Hoguane, que está
terminando o doutorado em Portugal, é um excelente conhecedor de políticas culturais e coordenador dinâmico de um departamento.
À tarde visitei com Lourenço as instituições Culturais de Maputo como Museus,
Centros Culturais, Galerias de Arte e Centro de Artesanato, onde vi excelentes
trabalhos. A
Fundação Fernando Leite Couto criada em 2015 em homenagem ao poeta falecido em
2013, irmão de Mia Couto, foi talvez a visita mais agradável. Conversamos com
pessoas que o estavam visitando, um artista local, um garçom conhecedor de Arte,
todos entusiasmados pelo trabalho em Literatura e Artes Visuais que a Fundação
faz. Naquele dia, 7 de novembro, estava sendo inaugurada uma exposição de Manuel
Bata intitulada “Os sentimentos das mãos” e na noite anterior havia sido
lançado um livro para crianças de Mia Couto. Em três anos a Fundação criada
pela família Couto já se tornou um fator de mudança, pois vem respeitando seu
lema “Fazer junto com os outros”.
Imagem: https://pt.wikipedia.org/wiki/Funda%C3%A7%C3%A3o_Fernando_Leite_Couto
Vendo
a ação multiplicadora de Lourenço Cossa em seu departamento reforçou-se minha
convicção de que os programas de bolsas de estudos do Brasil para nossos
colegas africanos são essenciais para que conheçamos as culturas uns dos outros
e as reforcemos mutuamente.
Ana Mae Barbosa, especial para AEOL